Autor de grandes obras como “Partida com a morte” e “O último homem sobre a terra”, Corrado Roi já emprestou, desde 1987, seu traço para mais de cinquenta histórias de Dylan Dog. Ele estreou no número 4 da série regular, O fantasma de Anna Never, mostrando que seu estilo era bastante apropriado ao personagem. Diante de tamanha competência, o staff responsável decidiu escalá-lo para desenhar o número 10: Alfa e Ômega – um clássico da série. Posteriormente, trabalhou na poética Nas profundezas, e logo na sequência emprestou sua técnica ao primeiro roteiro de Giuseppe Ferrandino para Dylan Dog, Eu te vi morrer. A sua melhor fase, segundo a opinião do autor deste texto, se deu no início da década de 90, com as duas histórias citadas na primeira linha do texto.

Ainda que visivelmente influenciado pelos trabalhos de Battaglia e Toppi, Roi é dono de um traço incomparável – sendo considerado por muitos o melhor desenhista de Dylan Dog em todos os tempos.

Entrevista publicada originalmente em 23/04/2018.

Você é conhecido por ter sido um talento precoce. Estreou em Dylan Dog aos 28 anos desenhando a clássica “O Fantasma de Anna Never”. Naquela época, teu traço não era tão “sombrio” quanto é hoje. Ainda que já estivesse bastante evoluído, ele tinha menos personalidade e buscava um pouco mais a representação fiel dos personagens e objetos. Ao longo do tempo você foi ajustando ele, se permitindo ousar mais e tornando os quadros ainda mais abstratos, distorcionistas e estilizados. Isso, ao longo de mais de 30 anos, fez de você um ícone, com um traço quase incomparável. Como você se sente sendo um artista ‘sui generis’ para Dylan Dog?
Corrado: Nas primeiras edições, a minha produção para DD não tinha nenhum estilo em especial: era o que eu conseguia fazer à época. Devo dizer que os primeiros números não me agradam tanto.
Considere que o meu trabalho não deve me divertir. O importante é divertir e agradar ao leitor. Assim, as escolhas estilísticas estão relacionadas ao retorno que recebo por parte dos leitores sobre o material que vai às bancas.
Artista? Acredito que não seja o termo mais adequado para o meu trabalho… Precisa ser um termo que me faça lembrar liberdade… “Prostituta profissional” é melhor.

Todo ícone, quando jovem, teve suas referências. Em quais artistas você se inspirou para desenhar deste modo? E quais suas preferências a termos de arte?
Corrado: Quando se é jovem, deve-se amar suas referências. Quando mais velho, deve-se respeitá-las. São muitos os quadrinistas que admiro. Posso citar Toppi, J. Jones, Battaglia, Breccia e Pinter… Quanto aos pintores, Caravaggio.

Sabe-se que, por conta da experimentalidade do projeto, as primeiras edições de Dylan Dog apresentaram roteiros não tão “perfeitos” quanto os das histórias realmente clássicas. Sendo um pouco mais crítico, pode-se dizer que os roteiros das três primeiras edições eram mais simplificados e não traziam aquele “algo a mais” que Dylan Dog proporciona. O número 4 trouxe um roteiro bem composto, com uma abordagem diferente – um pouco mais séria e reflexiva que as edições anteriores. Pode-se dizer que “O Fantasma de Anna Never” foi a primeira história que trouxe o Old Boy como os fãs gostam?
Corrado: Acredito que nas primeiras edições os roteiros eram mais claros, diretos e secos. Após ganhar uma certa sequência nas bancas, Dylan Dog começou a se tornar muito mais popular e querido entre os fãs. Eu não amo a “fase acadêmica” de Dylan Dog, portanto, prefiro o primeiro período.

Você desenhou o primeiro Tex “gótico”. Além disso, teve a oportunidade de fazer uma história empolgante que, até o último quadrinho, nos deixa a dúvida acerca da sobrenaturalidade do vilão. Ainda que contando com roteiro do Ruju, o jogo de cenas do Texone é mais vagaroso, não tão frenético quanto o que se pode observar habitualmente em Dylan Dog. Como você se sentiu desenhando Tex? O que você precisou mudar na sua técnica de desenho habitual para desenhar esse personagem?
Corrado: Foi uma loucura, desenhei tudo em oito meses. Provavelmente não era a minha vez de produzir um Texone, acredito que me colocaram lá para substituir alguém que não podia desenhar naquele momento. Quanto ao estilo… Foi o que eu pude fazer à época. Acredito que hoje em dia eu o faria de outra maneira.

Você trabalha com Dylan Dog há 31 anos. Pra você, qual foi a fase mais fascinante do personagem?
Corrado: Minha opinião é limitada apenas a analisar a qualidade dos roteiros… Melhor perguntar aos leitores, eu não tenho credibilidade para dizer qual a melhor fase…

Foi possível ver que, nos últimos anos, Dylan Dog acordou para o “novo mercado” dos quadrinhos e apresentou inúmeras novidades para agradar o público mais antigo e também angariar novos leitores. Entre elas, pode-se citar a volta de Sclavi, as edições especialíssimas dos color fest, a troca do capista, o convite a Dario Argento e outras… Como você vê o futuro de Dylan Dog?
Corrado: DD já mudou várias vezes ao longo do tempo. Agora, acredito que vai mudar de novo. Como será o novo Dylan Dog? Não sei. Não é da minha competência ficar analisando isso, afinal, o personagem não é meu. Apenas faço o meu papel ao longo do tempo.

Sobre Dario Argento em Dylan Dog: como ele está se portando como roteirista de quadrinhos? É fácil trabalhar com ele?
Corrado: A história deve ser lançada em breve, e não posso antecipar absolutamente nada. Exceto o fato de que é um pouco mórbida… De resto, não posso comentar. Ela não foi escrita apenas por Dario Argento, mas também por Stefano Piani.

Sabemos que teu traço em preto e branco é bastante cultuado pela atmosfera única que ele dá às histórias que você desenha. Porém, sua técnica de colorir é igualmente fantástica – nos deixando em dúvida sobre qual das duas opções é mais interessante. O que você acha mais interessante? Prefere fazer histórias em preto e branco ou se sente mais excitado quando tem um trabalho por colorir?
Corrado: A escolha da técnica está relacionada ao tipo do produto. Por exemplo: se o produto for para as bancas em uma tiragem grande, esta edição provavelmente não será adequada para a aplicação das cores, pois terá um nível gráfico (papel e impressão) mais baixo. As edições de livraria e comic shops podem ser definidas banalmente como “mais elegantes” e oferecem mais possibilidades, como papel, cores e a impressão de melhor qualidade. Consequentemente, isso permite um estudo mais aprofundado da técnica de desenho e a diversificação dela. Tudo depende do que a SBE me pede.

O seu primeiro teste para a SBE foi visando a entrada no staff de Zagor… Imagine: caso tivessem lhe admitido como desenhista de Zagor em 1987, teu traço seria diferente hoje em dia? No que você acha que ele mudaria? Se tornaria mais simplificado e menos sombrio?
Corrado: Dos velhos personagens da SBE, é o único que não tive a oportunidade de desenhar uma história. Caso pudesse, os faria de maneira popular: menos atmosfera e mais coerência em relação ao tipo da narrativa;

Uma última dúvida: quem é Corrado Roi? O que faz? O que pensa? O que lê? 
Corrado: O que sou? Um mamífero comum… E não reprodutivo. O que faço? Trabalho muito, e me interesso muito pelos materiais de suporte que me permitam desenhar e pintar com gosto. Me interesso também por política… E suas consequências. Gosto de muitas coisas e não gosto de tantas outras, como todas as pessoas.

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